segunda-feira, 14 de outubro de 2013

Crônicas sobre o Mundo do Trabalho #2 - O Rádio, a TV e o Chileno

Era só mais um bar com todo mundo reunido (ou era aniversário de alguém?). Papo vai papo vem, mais pessoas chegam, pop bubblegum é gritado aos berros por meninas embriagadas. “HIT ME BABY ONE MORE TIME!”. Desce mais cerveja. Por volta das 3 é sempre a mesma coisa, conversas paralelas, muitas delas, chega a ser difícil entender. O idioma varia entre um espanhol, adquirido por aulas da escola e mais umas 3 visitas a Buenos Aires, e um inglês, de cursinho e filmes sem legenda. São planos pro futuro, experiências psicodélicas e pura realidade cotidiana. Eis que o chileno cola do meu lado, resolve começar outro assunto paralelo e abandonar a verborragia à la ONU que rolava dois copos a frente.

“E você, Winnie Beanie, já decidiu sua habilitação?”.Que merda, esse papo chato de habilitação e eu querendo cantar aquela do N'Sync. Entenda uma coisa, eu e esses amigos fazemos todos Comunicação Social juntos, e essa conversa sobre habilitação já tava ficando insuportável quanto mais perto o fim do terceiro período chegava. Eu sempre tive tanta certeza basicamente em tudo, tanta certeza que minha mãe se orgulhava até no estúdio de tatuagem quando eu tinha 16 anos e burlava a lei pra entrar na agulha. “Essa aqui, diferente da outra (se referindo a minha irmã), sempre foi muito decidida, vai ser jornalista, vai estudar na UFRJ, por isso eu deixei fazer a tatuagem logo...”. Desculpa, mãe, acho que mudei de ideia. Eu já tava na faculdade há um ano e pouco, entrei estufando o peito e hasteando a bandeira “serei jornalista”, agora eu tava mais pra Julian Assange e pedindo pra outra pátria me acolher. Não sei como aconteceu mas comecei a pensar em outra habilitação, eu tentei não me deixar levar, mas essas coisas a gente não escolhe, eu estava envolvida com Rádio e TV. Portanto, quando chilenito fez aquela pergunta deu um aperto no coração.

“Ah, cê sabe né? Eu ainda não escolhi, mas andei pensando sobre... No final vamos todos morrer de fome mesmo!”, respondi. Essa era a minha estratégia dos últimos meses, eu declarei que estava dividida e que comunicaria quando decidisse. O que nunca parecia acontecer porque no final esse discurso era só pra evitar ter que pensar sobre isso. 

Esse meu amigo é o típico cara Rádio e TV, free love, cinéfilo, camisa xadrez e voz de quem não fica sóbrio há vários dias. É um cara muito gente boa, mas ele tem a insuportável mania de recrutar a galera que “tá em dúvida”. Acho que ele tá ganhando pra fazer isso, só pode!

Percebendo a minha fraqueza ainda persistente, ele começou. “Pô, eu acho que você tem tudo a ver com Rádio e TV. O curso vai ser muito mais dinâmico, Jornalismo é uma habilitação muito engessada, não tem espaço pra experimentação (pqp eu sabia que ele ia dizer isso!)... bla bla bla”. Ele engatava no ato dois do discurso e eu procurava algum lugar pra me distrair porque pela minha experiência ainda faltavam uns 3 capítulos e pelo menos 5 frases de efeito.

A uma certa altura do discurso veio algo novo, provavelmente uma nova ideia que ele teve algumas semanas atrás e resolveu testar pela primeira vez. “Pô, e eu tô percebendo que o mercado de trabalho em Rádio e TV tá muito melhor que em Jornalismo...”. Eu tive que voltar pro assunto. “Como assim, baseado em que isso?”, respondi. Ele começou a falar de como o curso era amplo e as áreas técnicas empregavam muito mais. Um papo que só me confundiu mais ainda. “Cara, todo o seu discurso tava super romantizado e artístico-inovador-criativo e multiplatafórmico, agora você vem com esse papo de técnico em funções de Rádio e Tv? Explica isso melhor.”. Pois é, até onde eu lembro a resposta não foi satisfatória e só me deixou mais confusa sobre o que ele queria com essa formação.

Desse papo torto de bêbado eu pude tirar duas conclusões sensatas. Olha que duas já é um milagre. Uma: Ninguém tem absolutamente ideia do que vai fazer quando acabar a faculdade. Sério. A maioria da galera não sabe o que de fato vai fazer, quais cargos estão disponíveis de acordo com a habilitação. E por que isso tudo? Porque comunicação é uma zona. Parabéns, você escolheu a carreira mais imprevisível no mercado atualmente. Você já devia ter percebido isso quando nem a sua faculdade funciona direito. Todas aquelas entrevistas que seu professor, que dava aquela matéria do primeiro período que você não sabe pra que servia mas tinha a ver com alguma coisa Brasileira (?), organizou já deveriam ter alertado. Corra, o mais rápido que puder, pro mais longe que conseguir. É furada. Em 80% dos empregos você vai ter uma vida de merda (adoro estatísticas infundadas). Tudo o que eu ouvi dos convidados que deveriam vir e trazer a luz do fim do túnel porque você tem sonhado com a sua avó batendo com uma frigideira na cabeça enquanto você pega seu diploma de Comunicador Social (eu não tô nem entrando na questão da habilitação), foi exatamente o contrário do que eu esperava, suplicava por ouvir. Discursos muito animadores. “Você não vai ter uma vida.”. “Você tem um namorado(a)? Se prepare pra terminar, você SÓ vai casar com alguém do ramo porque nenhum dos dois vai ter tempo ou vai falar de outra coisa”. “Você vai morrer de câncer porque vai começar a fumar e beber café 5 vezes mais.”. “Você vai pular de emprego em emprego.”. Adeus estabilidade, adeus pulmão.

A segunda conclusão me veio como uma solução pra evitar a depressão imediata causada pela primeira. Foi tudo muito rápido e eu não podia ter um aneurisma numa mesa de bar. Concluí que essas não são as respostas que importam até porque essa não é a pergunta certa. Foi só olhar ao redor e perceber que nem habilitação, nem emprego ideal eram a solução de nossos tempos. O comunicar era muito mais importante, era natural de cada um. Só o fato de estarmos ali importava. Dessas rodas já saíram tantas coisas... De empresas até curtas metragem. Ou mal ou bem já estávamos empregados. Éramos em torno de 10. Éramos atrizes, djs, artistas, fotógrafos, músicos, produtores, roteiristas, cineastas, blogueiros. Nenhuma dessas profissões consta no nosso diploma mas foi o que aprendemos a fazer com ele.

Por Wenny Milzfort

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